segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Mario Praz, A CARNE, A MORTE E O DIABO NA LITERATURA ROMÂNTICA



PRAZ, Mario. A carne, a morte e o diabo na literatura romântica. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 1996, 476 páginas + ilustrações.

            A obra em questão é um trabalho de referência no campo do romantismo negro. Estudando, nas primeiras partes, duas das principais literaturas da Europa – a francesa e a inglesa; a outra, não examinada, é a alemã -, Praz analisa o romance gótico, propriamente dito, das últimas décadas do século XVIII; o romain noir,  romance negro, influenciado pelo romance gótico; e os textos decadentistas das últimas décadas do século XIX. Pode interessar muito, ao que   aprofunda a sua sensibilidade em determinados estudos, essas distinções, descritas acima, que Praz realiza. Elas diminuem a possibilidades de erros como o esvaziamento do sentido do termo “gótico” na análise indiscriminada de qualquer obra, dos dois últimos séculos, em que predominam temas sombrios. Mas essas categorias podem não esgotar as tendências apontadas por Praz.
            Considerando apenas os primeiros três capítulos que tratam de autores individualmente, é estimulante acompanhar uma seleção de determinados nomes. Por um lado, autores mais visíveis, como Milton e Byron. Por outro, o de Sade, escritor curioso, mas que se teme comentar em ocasiões menos especiais. O primeiro torna o Satã medieval mais próximo do leitor; Byron é o divulgador mais popular e respeitado que continuou a elaborar a figura do herói romântico. Este é superior à sua comunidade, mas a abandona para desenvolver sua sensibilidade especial. Por fim, a influência de Sade é investigada nas fortes reações dos moralistas na desconcertante presença do encarcerado libertino em autores franceses muito disseminados entre o grande público. Mais inesperada é a influência do tratamento que Sade confere à milenar figura da donzela frágil e perseguida. O escritor francês é mais influente, entre os leitores do século XIX, que Richardson, autor de um romance edificante e oficial como Clarissa.
            No final do livro há muitas gravuras em papel especial. Se a apresentação das obras literárias já chama a atenção de um leitor pouco iniciado, as gravuras são mais acessíveis ainda para ele buscar sensações novas.
            Se eu tivesse que apontar uma única qualidade do livro, seria a divulgação de uma erudição em uma linguagem que não interesse apenas a um público muito especializado.
            Ma quem tem um gosto especial pelos assuntos abordados na obra vai se apaixonar pelas enormes notas que aparecem no final de cada capítulo. Ali há referências a livros muito específicos ligados a diversas passagens às quais elas se referem. Há até algumas longas resenhas dos livros apresentados por conta das notas. É como se o Praz estivesses orientando o leitor na elaboração de um plano de estudos sobre este ou aquele ponto abordado nas notas.
            Esse trabalho já está esgotado na editora. Pelo que verifiquei no Estante Virtual, o exemplar usado está muito caro. Pode ser bom para quem está fazendo muita questão. Mas, para os demais interessados, vale a pena fazer uma busca e esperar uma oportunidade melhor para adquirir o livro.
Eu lembro que, antes de ler sistematicamente ao menos os capítulos mais gerais do livro, examinava uma ou outra passagem e já ia para as notas. Esse costume manteve meu interesse ardente pelo texto e me criou uma excelente disposição para lê-lo mais tarde. Essa leitura aconteceu durante uma pesquisa acadêmica em que estava envolvido e deu grande suporte para eu viver minha fase mais criativa. Eu estudava e ficava enlevado o tempo todo. Quando um grande amigo e eu estávamos em casa, eu saía do quarto e lia, para ele, trechos do livro que tinham chamado minha atenção. Eu não queria me controlar e só esperava oportunidades para compartilhar meu entusiasmo. Tenho muito orgulho de ter lido esse trabalho com mais atenção. Sempre utilizo minhas anotações, pois essa obra é fundamental na sua área.