"Precisamos
de um mito para exprimir o fato obscuro e inconfessável de que a paixão está
ligada à morte e leva à destruição qualquer que se entregue completamente a
ela. Isso porque desejamos salvar a paixão e adoramos essa infelicidade, ao
passo que as morais oficiais e a nossa razão as condenam" (Denis de
Rougemont)
Eis
um dos pontos altos de minha criatividade! "História do amor no
Ocidente". Um livro perigoso para quem se apaixona, para quem é
imaginativo ou para quem é os dois. O objeto do amor é o próprio sentimento e
não uma pessoa. É uma das obras que valeram boa parte da minha formação. Tenho
quase trinta páginas de anotações e não usei nada na faculdade. Porém, é um
livro para o sentimento, para a poesia e, ao final de contas, para a vida.
A
proposta de Denis de Rougemont é bem interessante para quem estudou Trovadorismo
na adolescência. Por baixo daquele sofrimento dedicado à dama inacessível há
ideias de uma seita cristã, os cátaros, cujo grupo chegou a ser chamado de
"Igreja de amor". A seita foi
completamente exterminada no século XIII pela Cruzada Albigense.
O
que Rougemont quer provar é que a paixão, principalmente a paixão platônica (já
"resolvida" na Era da Psicologia), é um sentimento
"construído" por crenças religiosas. Para os cátaros, a vida do corpo
era um princípio do Mal. Uma das maneiras de combatê-lo é uma visão sobre o amor
na qual o homem, através de um ritual de vassalagem, submissão, jura dedicar
seu sentimento à dama que lhe concede esse favor. Porém o amor desenvolvido em
seu estado considerado puro, sem a interferência da realização sexual. Havia
mesmo o desejo de adiantar a morte para continuar o gozo desse sentimento no
espaço privilegiado do céu, em que não há mais o corpo humano:
"De
todos os males, o meu difere; ele me agrada; regozijo-me com ele; meu mal é o
que desejo e minha dor é meu bem-estar. Não vejo, portanto, de que me queixar,
pois meu mal advém de minha vontade; é meu querer que se torna meu mal; tenho
tanto gosto em querer assim que sofro prazerosamente, e há tanta alegria na
minha dor que me delicio com a minha doença" (Chrétien de Troyes, século
XII).
Os
participantes desse culto não eram necessariamente marido e mulher. Dessa
forma, uma das possíveis consequências da adesão ao catarismo era a condenação
do casamento, uma vez que o fiel não poderia se unir sexualmente a ninguém. O
casal herético poderia constituir elemento de um real triângulo amoroso. Com o
fim de ressaltar esse caráter clandestino do amor cortês, quero fazer uma
adaptação da citação que Rougemont faz de um trovador francês:
"Deus,
é a Aurora! Como Ela vem depressa" Como gostaria, meu Deus, que a Noite
não findasse, que meu amigo pudesse permanecer junto a mim, e que a Sentinela
jamais anunciasse o romper da Aurora! Deus! É a Aurora. Como Ela vem depressa!"
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